Desde auditoria e controladoria a compliance, cada cargo exige diferentes habilidades, que devem incluir capacidade de adaptação às tecnologias e regulamentações do mercado
Notícia
Contador, um aliado das micro e pequenas.
Nesta entrevista ao Diário do Comércio, o contador adianta que pretende formar um grupo de trabalho para formular propostas à nova secretaria.
01/01/1970 00:00:00
A Secretaria Especial da Micro e Pequena Empresa nem saiu do papel, mas o Conselho Regional de Contabilidade do Estado de São Paulo (CRC-SP) já se antecipou em colaborar com o organismo, que terá status de ministério, com propostas visando melhorar a gestão dos pequenos negócios. Será uma parceria especial, levando em conta todo o conhecimento que os profissionais da contabilidade têm sobre a rotina dos micro e pequenos empresários. "Conhecemos muito a realidade do segmento", afirma o presidente do CRC-SP, Luiz Fernando Nóbrega.
Nesta entrevista ao Diário do Comércio, o contador adianta que pretende formar um grupo de trabalho para formular propostas à nova secretaria. Ele aborda a importância da contabilidade em tempos de Sped e do processo de adaptação da contabilidade aos padrões internacionais. E mais: Nóbrega revela como o excesso de exigências fiscais gera conflitos entre o contador e o cliente.
Diário do Comércio – Qual a sua opinião sobre o projeto recém aprovado pela Câmara que trata da criação da Secretaria Especial da Micro e Pequena Empresa?
Luiz Fernando Nóbrega – Somos favoráveis à criação e queremos estar inseridos neste processo. Os profissionais da contabilidade são detentores de um conhecimento profundo das micro e pequenas empresas brasileiras. Como essas empresas não têm uma estrutura completa, com suporte de controladoria, finanças e de contabilidade, tudo é concentrado no contador. Conhecemos muito a realidade do segmento. A nossa ideia é formar um grupo de trabalho não só com pessoas do conselho de São Paulo, mas de entidades que representam a profissão, como o sindicato das empresas, dos auditores, peritos, para fomentar a nova secretaria com informações e sugestões sobre os principais gargalos do segmento. Queremos contribuir com sugestões para que a nova secretaria ajude a alavancar as empresas de pequeno porte.
DC – Por que é importante para as pequenas empresas adequarem a sua contabilidade aos padrões internacionais conhecidos como IFRS (International Financial Reporting Standard). É caro adaptar os balanços à nova realidade?
Nóbrega – Não é um processo simples transformar a contabilidade para os padrões internacionais, por isso é custoso. E hoje o micro e o pequeno empresário não enxergam o benefício. Não enxergam como investimento porque não têm ações na bolsa, não fazem transações frequentes com o exterior. Eles só vão enxergar quando tiverem uma reciprocidade do governo, seja por meio de incentivo tributário (carga menor para quem se adaptar), ou no mercado financeiro, com taxas de juros menores. Isso é possível porque as normas dão transparência às demonstrações contábeis. Quando existe transparência é possível, por exemplo, um banco avaliar melhor uma empresa que vai tomar um empréstimo se ela estiver dentro dos padrões internacionais. A instituição terá mais clareza sobre a realidade da empresa. Só que esse benefício ainda não foi assimilado pelo segmento. Quando o pequeno empresário começar a absorver as vantagens, com certeza vai migrar para as normas internacionais. E tudo indica que as pequenas empresas serão obrigadas a aderir num dado momento. E quanto antes elas se prepararem, melhor. É preciso encarar as normas como investimento e não como um custo.
DC – Qual o prazo para a adaptação às novas regras contábeis? Há algum incentivo governamental para quem aderir?
Nóbrega – As grandes empresas têm até o próximo ano para se adaptarem. Nos bastidores, cogita-se que os bancos, especialmente as instituições ligadas ao governo, deverão adotar taxas diferenciadas para as empresas que apresentarem balanços no padrão IFRS. O governo não sinalizou com incentivos tributários ou fiscais, o que seria muito interessante para aumentar o interesse pela migração do padrão atual ao internacional.
DC – Como está a relação contador/cliente? O acúmulo de trabalho, traduzido por novas obrigações acessórias, vem prejudicando essa convivência?
Nóbrega – O cliente tem toda a razão quando não vê naquele serviço adicional valor agregado nenhum. E de fato, não tem. O cliente entende o esforço dos profissionais da contabilidade para cumprirem as exigências do fisco. As obrigações exigidas pelo governo são crescentes, com altas multas, prazos exíguos para serem cumpridos e muitas delas são redundantes. Mas não trazem nenhum valor agregado para o cliente. Para o governo, ao contrário, os benefícios são nítidos porque ele acumula informações sobre o contribuinte, sabe quem vendeu, a quantidade e para quem. E para os profissionais da contabilidade essas exigências são um problema. Essas obrigações, que não são nossas porque somos apenas os intermediários, caem em nosso colo.
DC – E o que podem fazer?
Nóbrega – Temos de ir até o cliente orientá-lo a nos subsidiar com informações, alertamos sobre os prazos de entrega e o valor das multas. Estamos nos curvando. O governo manda o que ele quer, nós cumprimos, repassamos para o cliente, que tem reticências em pagar pelo serviço adicional.
DC – O que, na sua opinião, poderia ser feito para minimizar eventuais conflitos?
Nóbrega – Se o governo exige cada vez mais informações das empresas, que pague para os contabilistas. Seria uma ótima ideia. Não precisa desembolsar nada. Conceda um desconto em nossos impostos ou para o empresário que entregar no prazo e que esse desconto seja revertido em nossos honorários. Não é justo arcarmos com uma carga tributária cada vez maior, trabalharmos de graça para o governo e cada vez menos para o cliente. E ele ainda tem que pagar a conta? O profissional da contabilidade poderia agregar muito mais valor se fosse discutir um balanço com o cliente, uma estratégia de redução de custo ou resolver algum problema financeiro. Temos de desenvolver uma habilidade para lidar com isso.
DC – Com o Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), o fisco prometia reduzir o número de obrigações acessórias? Essa redução de fato ocorreu?
Nóbrega – O Sped completou cinco anos de vigência e na época da sua criação o fisco cogitou reduzir a quantidade de obrigações acessórias. Mas, ao contrário, o número delas tem aumentado. As antigas declarações exigidas se tornaram eletrônicas e perduram até hoje. E são redundantes, gerando custo para as empresas e para os próprios profissionais da contabilidade, que precisam de mão de obra para dar conta do acúmulo de trabalho. A contabilidade demanda muita mão de obra, o que tem levado a salários inflacionados. Estamos a ponto de ter um apagão de mão de obra. Hoje o profissional preparado está sendo disputado no mercado e os empresários do setor se esforçam para segurar os melhores.
DC – Em relação ao Sped, a nova exigência parece não ter sido assimilada pelos empresários.
Nóbrega – O empresário não entende muito bem – e não precisa, na verdade – o que é essa obrigação. Só que ele é o astro principal. Ele precisa nos dar condições para ajudá-lo a cumprir essa obrigação. Os profissionais do setor não conseguem resolver o problema do empresário sem o seu o envolvimento e predisposição para fornecer as informações exigidas. E atualmente há Speds de todas as cores, tipos, gêneros e credos e com prazos difusos. É uma gama enorme de obrigações e cabe aos contadores cobrarem os clientes. E se a entrega não ocorre dentro prazo, quem paga a multa é o profissional da contabilidade. É um jogo bem difícil e injusto.
DC – O CRC-SP tem aumentado a fiscalização para conter a atuação de maus profissionais. Como vem sendo realizado esse trabalho?
Nóbrega – Firmamos até o momento convênio com seis prefeituras para integrar as nossas bases de dados. Na maior parte das operações ligadas à abertura de empresas na prefeitura há a figura do profissional da área contábil envolvido, responsável pela operação. A ideia é que a prefeitura consulte a situação do profissional para saber se está ou não apto a exercer a profissão. Hoje, os profissionais se formam, passam por um exame de suficiência e fazem um registro no conselho. Ele pode estar suspenso por algum ato cometido, o registro está ativo, mas a pessoa não tem condições de trabalhar. Cabe à prefeitura tomar a decisão que quiser. O órgão pode denunciar ou bloquear o nome do profissional da sua base. Temos casos de pessoas que se passam por profissionais ou que não estão com registro ativo. Hoje, no Estado de São Paulo, há 140 mil profissionais aptos a trabalhar na contabilidade.
DC – A contabilidade é uma profissão do futuro?
Nóbrega – O curso de ciências contábeis está entre os dez mais procurados por estudantes no vestibular. E isso é animador porque há muita demanda por profissionais a ponto de os salários estarem inflacionados.
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